O home care, também conhecido como cuidado ou atenção domiciliar, é uma modalidade de assistência à saúde oferecida ao paciente em sua residência. O objetivo do cuidado em domícilio é proporcionar um tratamento contínuo, humanizado e, muitas vezes, menos oneroso. O modelo tem amparo em diversas legislações brasileiras que garantem o direito ao cuidado domiciliar tanto no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS) quanto nos planos de saúde privados. Com isso, há um crescente interesse no tema, principalmente devido ao envelhecimento populacional e ao aumento de doenças crônicas no Brasil. Neste artigo explicaremos o que é home care e como funciona.
O que é Cuidado Domiciliar?
Conforme a Portaria nº 825/2016 do Ministério da Saúde, o cuidado domiciliar é uma estratégia da política de atenção básica e em serviços de urgência, substitutivo ou complementar à internação hospitalar. O home care funciona como um conjunto de ações multidisciplinares diretamente no domicílio do paciente. Os serviços de saúde domiciliar incluem cuidados paliativos, reabilitação e tratamentos clínicos de média e alta complexidade. E a finalidade é evitar ou abreviar internações hospitalares longas.
Segundo a Lei nº 10.424/2002, o atendimento domiciliar faz parte da assistência prevista pelo SUS a pacientes cuja condição clínica permita a continuidade do tratamento em casa. Equipes multiprofissionais prestam atendimento que prevê o uso de tecnologias e procedimentos necessários para a manutenção da vida e bem-estar do paciente.
Outrossim, a Resolução COFEN nº 464/2014 estabelece a atuação do enfermeiro na atenção domiciliar e reforça a necessidade de planejamento e supervisão especial nos cuidados na casa do paciente.
Diferença entre Visita Domiciliar e Atendimento Domiciliar
É necessário compreender que, embora pareçam similares, a visita domiciliar e o atendimento domiciliar apresentam diferenças significativas. A visita domiciliar, segundo o Manual de Atenção Domiciliar do Ministério da Saúde, é uma ação pontual e preventiva. Esse serviço de saúde deve ser prestado por profissionais da atenção básica, como agentes comunitários de saúde e médicos, com o intuito de acompanhar e avaliar o estado de saúde do paciente.
Em contrapartida, o atendimento domiciliar, como previsto na Lei nº 10.424/2002, é um acompanhamento contínuo que pode exigir intervenções mais complexas, como a administração de medicamentos controlados ou a utilização de equipamentos médicos avançados. Portanto, o atendimento domiciliar é um serviço mais robusto e contínuo, podendo durar meses ou anos.
Qual a Diferença entre Cuidador e Home Care?
Enquanto o cuidador domiciliar exerce funções auxiliares e não necessariamente ligadas a aspectos técnicos da saúde, o home care engloba uma equipe de profissionais que inclui enfermeiros, médicos, técnicos de enfermagem e fisioterapeutas. O cuidador, em regra, realiza atividades mais simples, como alimentação e higiene pessoal de pacientes que não apresentam grave comprometimento para se alimentar ou locomover. A equipe multidisciplinar de home care, porém, está apta a realizar procedimentos médicos, como curativos complexos e fisioterapia respiratória, por exemplo.
Quando o Paciente Precisa de Home Care?
O paciente necessita de home care quando a sua condição clínica exige cuidados contínuos fora do ambiente hospitalar. Essa necessidade deverá ser devidamente fundamentada e atestada pelo médico-assistente que, conforme já explicamos em outro artigo sobre negativas de planos de saúde, é o profissional apto a determinar qual é o tratamento adequado em cada caso.
Home Care pelo SUS
Uma vez demonstrada a necessidade, o SUS deverá fornecer home care como parte de sua política de humanização e descentralização de cuidado, com base nas diretrizes da Lei nº 8.080/1990. O Programa Melhor em Casa, instituído pela Portaria nº 963/2013, regula o atendimento domiciliar no SUS. Esse programa prioriza pacientes com dificuldades de locomoção e que necessitam de cuidados paliativos ou reabilitação intensiva.
A Lei nº 10.424/2002 é a norma que garante o direito ao atendimento domiciliar pelo SUS, assegurando que pacientes que necessitem de tratamentos contínuos em domicílio tenham acesso ao serviço. O atendimento domiciliar no SUS visa a reduzir o tempo de hospitalização, prevenir infecções hospitalares e proporcionar um cuidado mais humano.
Programa de Atendimento Domiciliar ao Idoso
O Programa de Atendimento Domiciliar ao Idoso, regulado pela Lei nº 10.741/2003 (Estatuto do Idoso), assegura que os pacientes idosos com condições de saúde que exigem cuidados contínuos ou paliativos possam receber assistência em suas residências. Esse programa visa garantir a dignidade da pessoa idosa, com assistência contínua e adequada, conforme as suas necessidades.
Home Care no Plano de Saúde
No âmbito dos planos de saúde, a Lei nº 9.656/1998 determina a obrigatoriedade de cobertura para alguns procedimentos em âmbito domiciliar. Isso inclui o fornecimento de medicações para tratamento do câncer, bolsas de colostomia, ileostomia e urostomia, sonda vesical de demora e coletor de urina com conecto, por exemplo.
A Lei dos Planos de Saúde não prevê expressamente a obrigatoriedade do fornecimento do home care. Entretanto, a jurisprudência busca construir uma sólida base no sentido de determinar o custeio do serviço quando comprovada a necessidade através de documentação médica.
Importante lembrar, ainda, que o rol da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), mesmo não prevendo a obrigatoriedade dessa cobertura, é um rol mitigado. Ou seja, rol da ANS pode ser ampliado dependendo de cada caso, possibilitando o fornecimento do home care.
Outra possibilidade é o plano de saúde já prever, de forma inicial ou mediante aditivo, a cobertura contratual para atendimento e tratamento domiciliar contínuo. Nesses casos, sem dúvida o paciente conseguirá o serviço de forma mais fácil.
O que a Jurisprudência entende sobre o Fornecimento de Home Care?
Como dito acima, o fornecimento do home care é uma importante construção jurisprudencial que se baseia em uma visão sistêmica do ordenamento jurídico. A finalidade é garantir maior valoração à saúde e à vida em relação a questões meramente contratuais ou financeiras.
Abaixo, trazemos alguns exemplos dessa importante conquista:
APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS – PLANO DE SAÚDE – CERCEAMENTO DE DEFESA – INOCORRÊNCIA – INDEFERIMENTO DE PROVA PERICIAL – DESNECESSIDADE PARA A SOLUÇÃO DA LIDE – DOCUMENTOS SUFICIENTES – INCONTROVERSA A GRAVIDADE DO ESTADO DE SAÚDE DA AUTORA – NEGATIVA DE TRATAMENTO DOMICILIAR HOME CARE – INTERNAÇÃO HOSPITALAR – CONVERSÃO EM ATENDIMENTO MÉDICO DOMICILIAR – PRESCRIÇÃO DE SERVIÇOS DE ENFERMAGEM, FONOAUDIOLOGIA E FISIOTERAPIA PELO MÉDICO NEUROCIRUGIÃO – POSSIBILIDADE -CLÁUSULA CONTRATUAL OBSTATIVA – ABUSIVIDADE – DANOS MATERIAIS – COMPROVADOS – DANO MORAL – SITUAÇÃO QUE EXCEDEU O MERO ABORRECIMENTO – SENTENÇA MANTIDA – HONORÁRIOS RECURSAIS – MAJORAÇÃO (ART. 85, § 11 CPC)- RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. (TJPR – 9ª Câmara Cível – 0006549-75.2018.8.16.0001 – Curitiba – Rel.: DESEMBARGADOR DOMINGOS JOSÉ PERFETTO – J. 02.02.2023) (TJ-PR – APL: 00065497520188160001 Curitiba 0006549-75.2018.8.16.0001 (Acórdão), Relator: Domingos José Perfetto, Data de Julgamento: 02/02/2023, 9ª Câmara Cível, Data de Publicação: 06/02/2023).
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER CUMULADA COM INDENIZATÓRIA. PLANO DE SAÚDE. NEGATIVA DE ATENDIMENTO POR HOME CARE. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. APELO DA RÉ. O HOME CARE É DESDOBRAMENTO DO ATENDIMENTO HOSPITALAR CONTRATUALMENTE PREVISTO E, POR TAL RAZÃO, SUA LIMITAÇÃO CONSTITUI CLÁUSULA ABUSIVA E ILEGAL, FERINDO A BOA-FÉ OBJETIVA. NULIDADE DE CLÁUSULA LIMITATIVA QUANDO ESTA REPRESENTA RISCO DE VIDA AO CONSUMIDOR – COMPROVADA NECESSIDADE DO HOME CARE. VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA BOA-FÉ OBJETIVA E DO EQUILÍBRIO CONTRATUAL. CLÁUSULAS CONTRATUAIS QUE DEVEM SER INTERPRETADAS DE FORMA MAIS FAVORÁVEL AO CONSUMIDOR. INTELIGÊNCIA DOS ARTIGOS 4º, 47 E 51, TODOS DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. PROVA PERICIAL CONCLUSIVA NO SENTIDO NECESSIDADE DA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO NA MODALIDADE INTERNAÇÃO DOMICILIAR (HOME CARE). MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. CONHECIMENTO E DESPROVIMENTO DO RECURSO. (TJ-RJ – APELAÇÃO: 0218473-47.2020.8.19.0001 202300196421, Relator: Des(a). LUIZ HENRIQUE OLIVEIRA MARQUES, Data de Julgamento: 25/01/2024, VIGESIMA CAMARA DE DIREITO PRIVADO (ANTIGA 11ª CÂM, Data de Publicação: 30/01/2024).
Também vale a pena citar a importante Súmula nº 90 do TJ/SP, que diz:
Havendo expressa indicação médica para a utilização dos serviços de “home care”, revela-se abusiva a cláusula de exclusão inserida na avença, que não pode prevalecer.
Portanto, o home care visa assegurar um atendimento contínuo, humano e de qualidade, seja pelo SUS ou pelos planos de saúde particulares. Apesar de os diplomas legais não informarem sobre sua obrigatoriedade, hoje há entendimento amplo e majoritário em todo o país concedendo esse direito ao paciente. Em caso de dúvidas sobre como o home care funciona, fale conosco.